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Uma Leitura do Futuro do Agronegócio (Sifu)

29/03/2015 - Por marcos fava neves
Atenção: Os textos e artigos reproduzidos nesta seção são de responsabilidade dos autores. O conteúdo publicado não reflete, necessariamente, a opinião da ADEALQ.

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Prof. Dr. Marcos Fava Neves[1]

Neste texto tenho o objetivo de tocar em alguns assuntos de interesse aos produtores do Brasil. Divido a análise em 6 partes, começando pelo cenário macroeconômico e evoluindo para as questões estruturais do agronegócio.

 

1 - A Macroeconomia sem Alavancar o Agronegócio em 2015/2016

O ano de 2015, e provavelmente também o ano de 2016 serão dos mais difíceis dos últimos anos, face aos ajustes que precisam ser feitos e ao elevado grau de incertezas que temos pela frente. Gostaria de destacar aqui 20 pontos para nossa reflexão.

Acredito que:

1 – Teremos inflação persistente, ficando na casa de 6 a mais de 7%;

2 – Aumentos de preços administrados, gasolina (CIDE visando arrecadação), diesel e energia, principalmente, aumentando ainda mais os custos de produção nas cadeias produtivas;

3 – Desvalorização cambial: real permanecendo entre 2,60 a 2,80 em 2015 e podendo passar a mais de 3,0 em 2016/17;

4 – Tentativa de volta de alguns impostos (CPMF) pois o Governo pode não equilibrar as contas;

5 – Crescimento nulo (-0,5% a 0,5%) refletindo no ânimo das pessoas comuns, dos investidores e perdurando por mais dois a três anos;

6 – Gravíssima crise de água e energia elétrica (é a grande nuvem negra), pois um racionamento seria mortal à combalida economia brasileira;

7 – Juros mais elevados (Selic deve ir a 12,5%) para combater a persistente inflação e um provável aumento de juros nos EUA (face ao crescimento) agrava a situação de crédito e câmbio;

8 – Aperto monetário interfere no consumo e na seletividade do crédito, dificulta investimentos e principalmente deve afetar o giro das construtoras e outros;

9 – Commodities com preços menores afetam os termos de troca do Brasil, impactando na balança comercial;

10 – Agravamento da situação de países compradores de produtos brasileiros (Argentina, Venezuela) e economia mundial apenas em ligeira reação também não contribuem. Além disto, é preciso também fazer uma nota em relação ao efeito do terrorismo com o ataque na França e a recente eleição na Grécia como fatores de instabilidade;

11 – Forte redução do gasto público (busca de superávit de 1,5% a 2%) afetará investimentos, obras e a economia como um todo;

12 – Endividamento das famílias está elevado não tendo margem para ampliar crédito, afetando no consumo;

13 – Mesmo com a indicação de uma equipe econômica “pró-mercado”, observa-se ainda baixa confiança dos empresários;

14 – Teremos aumento do desemprego e da insegurança urbana e rural;

15 – Governabilidade está comprometida pelo resultado das eleições que fortaleceu a oposição. Congresso muito fragmentado e infiel;

16 – Crise de governança continua, com 39 Ministérios, aparelhamento nos cargos públicos e com exceções, um time de Ministros tecnicamente não adequados aos cargos;

17 – Crescimento dos movimentos sociais contra a má-gestão e a corrupção, que ganharão mais impulso com a deterioração do mercado de trabalho;

18 – Preços atuais do petróleo inviabilizando os investimentos no pré-sal;

19 – O tamanho da corrupção na Petrobrás e gravíssima crise na qual esta empresa foi colocada pela atual gestão ainda tem impactos desconhecidos. Fora isto, tem-se o efeito “dominó nas estatais”, com início também das investigações em outras estatais e bancos públicos.

20 – Estes escândalos levam a uma quase paralisia da gestão pública e das grandes obras;

 

Estas questões todas colocadas impactarão o país e também a agricultura e os mercados de alimentos, tanto no consumo quanto nas pressões para redução de preços. Nestes casos, sempre sofrem mais os mercados de produtos mais supérfluos na alimentação. Os impactos específicos na agricultura são abordados na próxima sessão.

Ressalto que com ajustes adequados e dolorosos, o Brasil tem condições de retomar o crescimento, pois existem pontos positivos na macroeconomia, como o alto volume de reservas, o país apresenta condições importantes para atrair capitais internacionais para investimentos de longo prazo, como vem atraindo anualmente, afinal apresenta o sétimo maior mercado consumidor do mundo, com grande presença de recursos produtivos sub-explorados e valores consolidados como a democracia e instituições, tanto na área pública quanto privada. Portanto, apesar do momento e do estágio onde chegamos, não podemos perder a confiança e esperança em nossa economia.

Este é justamente o fato que deve ser analisado semanalmente. Faço uma analogia com um regime. Se os resultados do ajuste, do sacrifício começarem a aparecer rapidamente, haverá um estímulo e uma retomada da confiança, voltando investimentos e ajudando o Brasil a sair da situação em que se encontra. Paralelamente aos necessários ajustes, duas outras ações seriam fundamentais para injetar ânimo: medidas fortes para ganhos de produtividade das indústrias, e um amplo programa de concessões, privatizações de infraestrutura pública (rodovias, portos, aeroportos...) ajudaria a movimentar a pálida economia.

 

2 - O Complexo Cenário em 2015/2016 para a Agricultura

As safras 14/15/16 serão desafiadoras, após anos de bonança em preços, a rentabilidade da produção de grãos deverá cair face principalmente a grandes safras no mundo, notadamente nos EUA, e expectativas também de bons plantios e produções nos países do Mercosul.

A CONAB estima uma safra de grãos entre 194,4 a 199,9 milhões de toneladas, podendo ser 0,1% menor que a safra 13/14 até 2,7% maior no limite superior. Esta será produzida em uma área entre 56,6 a 58,1 milhões de hectares (13/14 foi de 56,96 milhões de hectares) com produtividades esperadas ligeiramente acima das observadas em 13/14.

Os dois principais produtos, milho e soja, devem ter bom desempenho, sendo a produção de soja esperada entre 89,3 mi.t. até 91,7 mi.t, ante a 86,1 mi. t. na safra 13/14. No caso do milho, a produção esperada fica entre 77,3 a 78,9 mi.t., ante a 79,9 mi. t. na safra 13/14. As estimativas da CONAB não consideram ainda o impacto de veranicos em algumas regiões produtoras, que trazem perdas nos enchimentos dos grãos e da safra como um todo.

Da mesma forma, coloco 20 pontos para a reflexão dos leitores em relação às safras 14/15 e 15/16. São esperados os seguintes fatos e impactos:

 Momento de bons estoques mundiais (recompostos);

 Perspectiva de boa oferta nos leva a menores preços comparados aos anos de bonança mas acima dos preços de antes de 2007/2008, ficando na parte mais baixa do novo patamar de preços;

 Maior flutuação das cotações (soja) e mesmo com cotações médias mais baixas, existirão oportunidades para fixação em patamares interessantes, portanto devemos ter habilidade de comercialização;

 Maioria dos produtores postergou a comercialização e não fixou preços no aguardo condições mais atrativas;

5 – Aumento do risco de crédito ao distribuidor de insumos (revendas e cooperativas), em alguns casos com solicitação de prorrogação de prazos de pagamentos;

 Pode fortalecer a prática de barter, pois proporciona hedge ao agricultor e reduz risco de recebimento;

 Safras onde ganham maior importância as políticas de crédito conservadoras;

 Menor rentabilidade levando o agricultor optar por soluções tecnológicas de menor custo;

 Fertilizantes, sementes e defensivos são impactados na queda de rentabilidade dos produtores, mas o maior impacto em vendas será em máquinas e implementos, pois são a solução menos dolorosa nas decisões de postergar investimentos

10  Desafio maior de rentabilidade nas fronteiras agrícolas,  com incremento de risco;

11  Situação mais apertada deve levar a um aumento na participação de arrendamentos, pois muitos deixam a atividade, arrendando para produtores mais eficientes, que crescem na crise;

12  Desvalorização do Real perante o Dólar gera riscos para insumos importados e  por outro lado compensação de preços das commodities quando transformados de dólar para real.

13  Cenário mais complicado, mas com expansão da área agrícola, pelos fundamentos favoráveis de médio e longo prazo de nossa agricultura;

14  Áreas em expansão carregam favoravelmente o mercado de insumos, que continuará crescendo, mas o desafio será a oferta de crédito;

15  Momentos difíceis aceleram o processo de concentração e profissionalização do setor por produtores com melhores gerenciamentos e controles;

16  Logicamente, qualquer evento climático não esperado muda o quadro, como mudou em anos anteriores;

17  É muito grave o quadro da água (restrição à irrigação e seca no sequeiro);

18  E grave a questão da energia: encarecimento e falta;

19  Efeitos do petróleo barato no consumo de alimentos: negativo em Rússia, Angola, Venezuela, que são países que dependem dos preços para financiar suas atividades.

20  Por outro lado, petróleo e gasolina mais baratos em mercados importadores terá impacto positivo no consumo de alimentos em grandes mercados como China, India, EUA e outros, ou seja, o que se economiza em combustível pode ser alocado para melhorar os padrões de alimentação;

 

Apesar de dificuldades previstas nas safras 14/15 e 15/16, existe uma preocupação que gostaria de levantar neste momento do texto, mais estrutural, que pode atrapalhar a conquista de mercados pela agricultura brasileira: o aumento dos custos de se produzir no Brasil.

 

3 – O Preocupante Aumento dos Custos de Produção no Brasil

Apesar dos incríveis ganhos de eficiência e produtividade em muito setores, do show na renda agrícola, que passou de R$ 257 bilhões em 2004 para provavelmente mais de R$ 450 bilhões em 2014, e do salto nas exportações, que passaram de US$ 20 bilhões em 2000 para praticamente US$ 100 bilhões, nestes últimos anos, a agricultura brasileira passou por algumas transformações que merecem destaque, entre elas, o considerável aumento de custos de produção nos últimos anos, que teve contrapartida no aumento de preços das commodities, mas é um quadro preocupante quando os preços caem e nas perspectivas futuras. Impactaram as seguintes questões:

ü  Custo do trabalho (aumento de 100% em dólar em 10 anos) e das crescentes exigências e questões trabalhistas;

ü  Pessoas deixando de procurar trabalho afetando a disponibilidade e o custo da mão de obra (61 milhões de pessoas em idade de trabalho não procuram emprego, não trabalham e não estudam no Brasil);

ü  Custos ligados aos aspectos ambientais, exigências crescentes e normas complexas;

ü  Custos do crime, como roubos de cargas, de propriedades, necessidade crescente de seguros e segurança nas propriedades e lamentável fortalecimento do crime organizado no Brasil;

ü  Custos das operações logísticas, apesar de recentes privatizações, é o ponto que poderia ser mais facilmente resolvido, mas caminha muito aquém das possibilidades;

ü  Custo inerente à baixa capacidade de armazenagem da safra brasileira;

ü  Custos ligados aos tributos e principalmente, à complexidade tributária;

ü  Custos gerais da burocracia do Estado, do tempo gasto nos excessos de procedimentos, do tamanho excessivo e reduzida eficiência do Governo (um dos piores pontos no ranking de competitividade mundial);

ü  Custos crescentes e menor disponibilidade de capital, com elevação de juros e dificuldades de acesso ao crédito governamental;

ü  Custo da corrupção nas empresas estatais e no Governo, nos três níveis (Federal, Estadual e Municipal), onerando o setor produtivo;

ü  Retorno da inflação;

ü  Falta de adequado entendimento de parte do Poder Judiciário sobre o funcionamento das cadeias produtivas e os recentes casos de intervenções inadequadas na citricultura e na cana, além dos problemas de invasões indígenas, de sem-terras e outras que trazem insegurança jurídica;

ü  Perda de eficiência em parte das Agências Reguladoras, como exemplo a lentidão nos processos de aprovação na ANVISA, dificultando acesso a produtos importantes tanto para plantio quanto para defesa da produção;

ü  Crescente custo ideológico, com movimentos contra a produção, contra as empresas e contra o lucro atingindo estudantes e jovens no Brasil.

 

Estes fatos todos, que não são exclusivos à agricultura, fizeram com que a geração de renda no Brasil ficasse comprometida, o que se observa com o crescimento quase zero de nossa economia e a redução de 3% da atividade industrial em 2014.  Este “andar de lado” da geração de renda está comprometendo e vai comprometer a distribuição de renda em 2015 e nos anos seguintes.

É necessário que o setor público e privado trabalhem fortemente para reduzir estes custos de produção visando tornar o país mais competitivo e os produtores, mais capazes de suportarem períodos de menores preços e continuarem conquistando espaço no mercado internacional, gerando dólares para impulsionar o crescimento do Brasil. Caso isto não seja feito, o Brasil corre grandes riscos de não ser o vencedor no indiscutível aumento de consumo de alimentos que ocorrerá no mundo, que comento mais adiante.

Feita esta análise do aumento dos custos de produção, a próxima sessão aborda mudanças estruturais nas cadeias produtivas do agronegócio, que transformam o rural de maneira definitiva.

 

4 - Mudanças Estruturais da Agricultura 2015-2025

 

Entre muitos países produtores, o Brasil é provavelmente o que mais de se adequa a análises dessas tendências e mudanças apresentadas a seguir. É o novo cenário da agricultura, interferindo cada vez mais na vida dos agricultores. Da mesma forma que com a situação macroeconômica e da agricultura, apresento uma lista de 20 grandes mudanças que creio ocorrerem nos próximos 10 anos:

 

 Viveremos períodos de aumento da volatilidade de preços na agricultura mundial;

 Crescentes riscos devido às mudanças climáticas regionais e globais e maiores pressões na área de sustentabilidade, da economia de carbono (“carbon footprint”) e outras;

 Crescentes interferências das políticas governamentais, sejam de impostos, acesso a mercados e outros tipos de controles e exigências. A questão política cada vez mais intrincada no agronegócio;

 Portfólio tecnológico e acesso à tecnologia assumirá uma posição cada vez mais importante;

 Aumento na concentração dos produtores rurais (mais propriedades sendo gerenciadas por um número menor de produtores mais eficientes) impactará fortemente na forma de negócios nas cadeias integradas do agronegócio;

 Mudanças no comportamento do produtor, cada vez mais profissionalizado e informado aumentando constantemente as exigências, o conhecimento técnico e mercadológico;

 Maior acesso à informação, a maioria destas gratuitas, sobre produtos, serviços e preços praticados em diferentes regiões;

 Diversificação da agricultura para outras regiões e atividades, fortalecendo a integração de grãos com produção de proteína animal, energia (biomassa) e atividades florestais. Agricultura do futuro será muito mais integrada;

 Aumento das necessidades de capital, com necessidade de desenvolver novas alternativas de suporte e crédito para atender as necessidades de capital de giro dos agricultores;

10  Interferências e restrições maiores sobre o uso da terra;

11  Complicações referentes ao uso da água, desde escassez, aumento de custos até pressão da sociedade (“water footprint”);

12  Oportunidades para o trabalho urbano aumentam a dificuldade de mão de obra rural e mão de obra continua a ser um dos mais difíceis aspectos para o agronegócio;

13  Escassez de recursos para a produção agrícola em muitas regiões, notadamente China e Índia os tornará cada vez mais dependentes de importações. Apesar de grande importadora hoje, deve ser observado qual o papel da África nos próximos 10 anos.

14  A necessidade de escala é um princípio básico para ganho de eficiência e redução de custos. O conceito que se tem hoje da fronteira da propriedade será fortemente revisto em 10 anos para gestões de espaços integrados;

15  Mudança no balanço de poder na direção dos grandes agricultores organizados e mega-empresas integradas de comercialização e logística trará um “retorcimento” das cadeias integradas e novos players participando de funções que antes não executavam;

16  Agricultores estão se organizarão cada vez mais grupos de compra, cooperativas e centrais de cooperativas, ajudando na necessidade de boa gestão da terra, dos ativos e custos via ações coletivas;

17  Diferentes perfis de agricultores com diferentes combinações de atributos técnicos, relacionais e de preço se tornarão cada vez mais importantes ao se analisar o comportamento de compra dos agricultores;

18  Aumento da exposição ao risco e da demanda por capital devido à oferta de produtos e serviços mais sofisticados e das novas dimensões da agricultura;

19  O uso da tecnologia permitirá mudanças incríveis, a maioria relacionada à integração de atividades e à agricultura digital (“nas nuvens”);

20  Grandes desafios no tocante à sucessão nas propriedades rurais, nas entidades de classe, associações, sindicatos e cooperativas, entre outros. Uma nova era de governança nas organizações (entidades de classe, associações, sindicatos e cooperativas) estará em curso.

 

Em se pensando nestas mudanças, fica evidente que a agricultura em 2025 será diferente do formato atual de se produzir. O importante disto tudo é que não faltarão oportunidades para se colocar nos mercados os produtos dos países que produzirão de maneira eficiente, e o Brasil tem grandes chances de aumentar fortemente as exportações no cenário atual, e mais ainda se fizer as reformas estruturantes demandadas no item 3. Vamos agora falar das coisas boas, as grandes oportunidades.

 

5 – O Brasil tem Oportunidades Imensas no Curto, Médio e Longo Prazo

Os direcionadores (drivers) de consumo são muito positivos para a agricultura brasileira, e podem ser resumidos nos seguintes:

ü  População chegará a 9 bilhões de pessoas em 2050, portanto necessitamos produzir para mais 2 bilhões;

ü  Existe intensa urbanização, estimada em cerca de 90 milhões de pessoas por ano, que impacta no hábito de consumo (mais proteína demandando mais grãos) e nas quantidades demandadas de produtos;

ü  Crescimento econômico mundial, principalmente nos países emergentes, que são os grandes mercados futuros de alimentos, impactando diretamente em suas necessidades de importações ;

ü  Distribuição de renda na sociedade impacta positivamente o consumo e esta vem acontecendo, aliada ao crescimento econômico;

ü  Grandes programas governamentais de distribuição de alimentos e de renda à parcela mais miserável das populações impactam forte e favoravelmente o consumo;

ü  Crescimento do mercado de alimentação para animais, sejam os produtores de proteína, como de recreação (mercado pet), com taxas elevadíssimas em muitos países;

ü  Onda BIO: mesmo com o preço do petróleo em baixa, o que traz ameaças, volta a crescer no mundo a conscientização do biocombustível, desde o etanol, biodiesel, bioquerosene, biogasolina, biopneu, bioplástico, bioeletricidade, todos demandando produção agrícola. Todo país que assina uma meta de uso de biocombustível misturado ao combustível fóssil abre uma oportunidade ao Brasil.

É um desafio avaliar quais países do mundo estão mostrando as maiores oportunidades em termos de crescimento no mercado de alimentos. Antes de apresentar suas características comuns, convido os à rápida viagem virtual em meio a alguns números surpreendentes que mostram a urbanização e mudança de consumo.

A Indonésia possui cerca de 252 milhões de habitantes e a rede de fast food KFC inaugurou sua primeira loja em 1979 sendo que em 2013 a rede já possuía 470 restaurantes no mesmo. Em 2011, a Indonésia possuia 5.900 restaurantes fast food e para 2017 é esperado que o país alcance cerca de 9.000 unidades. Possuindo 175 milhões de habitantes, a Nigéria teve sua primeira loja da rede KFC em 2009, sendo que após 3 anos esse número saltou para 25. Na Nígéria, a indústria do fast food cresce mais de 10% ao ano.

O McDonald´s iniciou suas atividades na China em 1990. Hoje o país conta com 2.000 restaurantes sendo o terceiro maior mercado da companhia com US$ 2,8 bilhões em vendas em 2013. O Vietnã possui quase 100 milhões de habitantes e o fast food está crescendo 26% ao ano, triplicando os restaurantes em 5 anos. A rede KFC inaugurou seu primeiro restaurante em 2011 e atualmente possui 140 lojas que geram cerca de 4.000 empregos. O McDonald´s abriu sua primeira loja no Vietnã em 2014 e atendeu 20.000 consumidores nos dois primeiros dias. O Paquistão possui quase 200 milhões de habitantes e representa um mercado de U$S 1 bilhão por ano, com crescimento anual de 20%, para ficar em alguns exemplos.

Essa explosão no número de redes fast food ocorre pois essas companhias conquistaram a confiança dos consumidores contando com alta confiabilidade em suas cadeias de suprimento e demonstrando preocupações com questões relacionadas à saúde da população. Também é possível notar que ocorreu uma ocidentalização das novas gerações com o grande uso de dispositivos móveis.

São muitos os fatores que temos que observar para identificar os mercados de alimentos em expansão nos próximos anos e que merecem atenção por parte das empresas brasileiras e ações de construção de posições nestes mercados:

 

ü  Grandes populações (em quantidade de habitantes);

ü  Populações crescentes (taxa de crescimento da população);

ü  Elevada população jovem (com tendência de crescimento);

ü  Rápida urbanização (alto percentual de pessoas que ainda vivem na área rural e estão se mudando para as cidades);

ü  Geração de renda (crescimento do PIB);

ü  Distribuição de renda (crescimento da classe media);

ü  Possuem recursos com valor a serem exportados  (petróleo/gás/minerais) gerando capacidade para pagar pelas importações de alimentos;

ü  Apresentam deficiência em recursos produtivos  (baixa disponibilidade de terras, de água, ausência de outros recursos e capacidade para investir e receber investimentos estrangeiros diretos para a produção de alimentos);

ü  Leis que favorecem a importação de alimentos (abertura para importações, poucas barreiras como taxas de importação, cotas, barreiras sanitárias;

ü  Apresentam sensibilidade decrescente trazendo esforços reduzidos para a questão de segurança alimentar/produção local e apresentam estabilidade dos governos/ ambientes institucionais;

ü  Adoção de políticas favoráveis à mistura de biocombustíveis na gasolina;

ü  Disponibilidade de canais de distribuição para importação e sistemas logísticos factíveis. Apresentam atratividade para que varejistas internacionais levem alimentos a esses países utilizando recursos estratégicos globais (estratégias de “global sourcing”;

ü  Taxas de câmbio que favorecem a importação de alimentos (moedas locais valorizadas).

 

Como alguns exemplos, China, Índia, Indonésia, Vietnam, Paquistão, Nigéria, Angola, África do Sul, México, Brasil e países agregados do Oriente Médio, entre muitos outros. Ainda veremos grandes surpresas nesses países, uma vez que os mesmos possuem muitos mercados de rua, alta informalidade nas cadeias alimentares e ausência de dados disponíveis. Passarão cada vez mais a serem grandes importadores.

 

Essas são algumas características dos países que não podem deixar de constar nas estratégias de organizações mundiais de bens de consumo para os próximos anos, sendo grandes oportunidades para países exportadores de alimentos como o Brasil. Mas quem vencerá esta batalha por mercados que estarão ávidos por produtos?

 

6 - Quem Vencerá a Disputa da Oferta de Alimentos aos Crescentes Mercados?

Os países e regiões vencedoras na oferta de alimentos para a crescente demanda são os que tiverem e manejarem bem os recursos necessários para se produzir, sejam os naturais (fontes de vantagem comparativa) como os inerentes à atividade humana (fontes de vantagem competitiva).

 

Aqui estão como uma lista de trabalho.

ü  Terra e solo (disponibilidade e preço);

ü  Água e clima (presença e custo);

ü  Fator trabalho, com disponibilidade de mão de obra produtiva, e qualidade da educação;

ü  Nutrientes (fertilizantes...) disponíveis e a preços competitivos;

ü  Tecnologia, pesquisa e desenvolvimento fortes gerando soluções aos problemas e produtividade;

ü  Informação disponível e conectividade (velocidade de transmissão de informações);

ü  Disponibilidade de capital: crédito ($) para investimentos e seguro de produção e renda;

ü  Instituições (leis) com credibilidade e confiança e em contínuo aprimoramento;

ü  Organizações (associações) eficientes e propositivas, bem gerenciadas;

ü  Eficiência de Governos, promovendo investimentos, marcos regulatórios e privatizações;

ü  Energia – disponibilidade e competitividade de custos para os produtores;

ü  Capacidade de estocagem, malha eficiente de transporte e operações logísticas;

ü  Capacidade de gestão agrícola nas propriedades, evitando duplicidades e desperdícios;

ü  Capacidade de coordenação da cadeia produtiva (sistema agroindustrial) reduzindo custos de transação e promovendo ações conjuntas para desenvolvimento setorial;

ü  Comunicação adequada da atividade produtiva como geradora de valor na sociedade;

Estes são os recursos que precisam ser trabalhados para maior competitividade do agronegócio, via Governo e cadeias produtivas integradas, e com isto aumentar a capacidade de geração de renda no Brasil, que possibilitará o Governo continuar as ações de distribuição de renda.

Além da agenda de políticas e ações públicas, é fundamental a presença de um setor privado ativo, inovador. Portanto, no âmbito empresarial, sempre relacionado com o público, é necessário às empresas atuarem no modelo que chamo de CCCV (criação, captura e compartilhamento de valor), visando o tripé de ações estratégicas em diferenciação, custos e ações coletivas.

Em diferenciação destaco as importantes estratégias de CCCV ligadas à: construir uma abordagem de relacionamento integrado e oferta de soluções ao comprador; fortalecer sempre a pesquisa e a inovação, construir estratégias de fidelização, inovando em produtos/serviços, imagem e marca, soluções de embalagens, canais e força de vendas, serviços e finalmente, ter como foco oferecer performance para o comprador. Buscar sempre a sustentabilidade e as certificações de excelência.

 Em custos destaco as importantes estratégias de CCCV ligadas à: explorar com competência atividade central da empresa (o core business); melhor uso de todos os ativos e recursos de organização; estratégia de produção em escala; qualidade, segurança e custos de insumos; eficiência em trabalho (simplicidade); contínuo redesenho das operações; estímulo de competição entre fornecedores; arquitetura financeira criativa (fontes de $$$); reduzir o poder de barganha dos vendedores; busca dos melhores momentos de compras; contratos estáveis buscando reduzir custos de transação; uso intensivo de inovações tecnológicas redutoras de custos e gestão “celular” dos custos de produção.

Finalmente, em ações coletivas, destaco as importantes estratégias de CCCV ligadas à: ações coletivas horizontais (empresas da mesma indústria) e verticais (da mesma cadeia produtiva), ações com empresas não relacionadas; fortalecer as associações setoriais  e entidades de representação, participar de cooperativas, criar a fortalecer consórcios e alianças estratégicas, entre outras formas de trabalho cooperativo. Melhorar a cadeia de suprimentos via montagem de centrais de compras, ações conjuntas em produtos/marcas/embalagens e serviços, canais de distribuição e vendas, comunicação, precificação, entre outras. É uma área onde o agro brasileiro tem muito a melhorar.

Estas seriam então as contrapartidas, ou as estratégias do setor privado para um agronegócio brasileiro cada vez mais competitivo.

 

Conclusão

Apesar de um 2015/2016 muito difíceis, acredito que com ações adequadas nos ambientes públicos e privados para redução dos custos de produção no Brasil e melhoria na utilização de recursos, listados no item anterior, temos condições de continuar avançando sustentavelmente em direção à mais produção e mais exportações. O agronegócio não é a única, mas sem dúvida é a maior chance aberta à sociedade brasileira para inserção mundial nos próximos 30 anos, promovendo com isto o desenvolvimento econômico, social e ambiental de nossa sociedade.

O próximo passo é olhar como fazer isto, à partir desta lista e trabalhar fortemente em um plano estratégico com claros objetivos, adequadas estratégias e arrojados indicadores a serem alcançados.

 

Marcos Fava Neves (Sifu - Engenheiro Agrônomo - F-91) é Professor Titular de Planejamento e Estratégia na Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo, Campus de Ribeirão Preto, coordenador científico da Markestrat. (www.markestrat.org).

 Email: favaneves@gmail.com

 



[1] Texto preliminarmente preparado para o tradicional almoço de encerramento do ano (em sua nonagésima quinta edição) da Sociedade Rural Brasileira, São Paulo, 08/12/14. Esta versão já contem diversas atualizações. 

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