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Tempo bom... (Vavá F66)

19/08/2016 - Por evaristo marzabal neves
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(Publicado no jornal “O Arado” do CALQ,  Ano 67, Agosto 2007, n.3, p. 20, coluna “Na minha época”)

“Tempo bom...

Que não volta mais...saudade...tá ficando pra trás”. Saudade do tempo de estudante da ESALQ na  primeira metade dos anos 60. Pena que é passado, tempo bom que não volta mais. Saudade do bondinho que tinha como partida de viagem para a ESALQ um ponto atrás da catedral (três quadras da saudosa republica “Viúva da Colina”, na Moraes Barros, que fundamos em 1962 e vimos fenecer em 1966, quando cinco dos republicanos se formaram)  e nele iam boa parte dos alunos que moravam no centro, recolhendo no caminho outros de republicas próximas ao trajeto do bonde e professores que se misturavam conosco, já que carro, poucos o tinha. Interessante que o bondinho era um coletivo de integração, de forte amizade, no estribo ou sentados, alunos dos 5 anos da agronomia  e professores jogando “conversa fora”. Era, também, o sinal e campainha de termino de aula, pois quando passava em frente do Pavilhão de Zoologia (hoje, Ciências Humanas), pouco antes das 11 horas da matina e se dirigia até o Ruca´s (ponto final na ESALQ), era a hora em que o Prof. Salvador Toledo Piza terminava a aula para que houvesse tempo de subir no estribo do bonde e rumar à cidade. Então tome almoço às 11 e meia, no mais tardar, pois, meio dia e meia, voltava-se ao bonde e às 13 horas começavam as aulas praticas que se encerravam às 16 horas. Daí, boa parte se dirigia para a praça de esportes, para os “rachinhas vespertinos” ou treinando nas diversas atividades esportivas visando a defesa do “A encarnado” nos campeonatos universitários.

O sistema de aula era seriado, não existiam optativas e se ficava um ano inteiro numa Cadeira (não era Departamento ainda, que surge em 1968) e, neste sistema de Cátedra, as aulas teóricas, dadas pelo catedrático transcorriam num silêncio absoluto, onde os alunos mantinham disciplina e respeito, pois, em muitas Cadeiras, até  8:10h, mais ou menos, fechava-se a sala com chave e, pronto, nem o bedel (que fazia a chamada) tinha autorização para deixar entrar. O bedel de cada turma conhecia todo mundo.

No ano que ingressei na ESALQ não houve formatura, pois correspondia a mudança de 4 para 5 anos, havendo, portanto, um hiato e não entravam 200 alunos, de tal forma que no 1º semestre de 1962 não chegávamos a 500 alunos cursando agronomia. Era fácil conhecer quase todo mundo, daí entender que na Semana Luiz de Queiroz, nas comemorações de qüinqüênios, as turmas dos anos 50, 60 e até dos 70, são as mais animadas e saudosas e, relativamente, mais presentes em termos de adesões e comparecimento. Todos se julgavam não apenas filhos da Luiz de Queiroz, mas acima de tudo filhos de Luiz de Queiroz. Nós nos apegamos bastante pois, no 1º ano, como tínhamos aulas aos sábados (matemática com o Prof. Pimentel Gomes), quase não se viajava nos fins de semana e aqui ficávamos curtindo o Café Haiti, o Brasserie, Grill Dog, a missa das dez no domingo na Catedral, as festas e bailes promovidos pelas Comissões de Formatura, o “footing” em frente ao Politeama, Art-Palacio, Broadway, os cinemas da época. Lins, minha terra natal, só na Semana Santa, da Pátria e nas férias.

Saudade do CALQ e seu prédio, inaugurado em 1963, quando cursava o 2º ano. Quanta coragem, raça, peito, determinação e garra das diretorias e agricolões dos fins dos anos 50 e inicio dos 60 em construir o prédio do CALQ. Quantas campanhas, rifas, promoções, para conseguir cimento, tijolos, doações financeiras, etc. E, após a conquista de construir um prédio, vem a revolução de 1964, e ali estavam os heróis que “seguraram a barra” e, posso estar enganado, foi com o Centro Acadêmico XI de Agosto (Direito, Largo de São Francisco), os únicos resistentes a não se transformarem em diretórios acadêmicos. Uma legenda, um foco de resistência acadêmica. Ai que saudade do CALQ, local que abrigava todas as iniciativas dos agricolões, AAALQ, das reuniões, debates, políticas universitárias, discussões ideológicas, elaboração de apostilas das disciplinas das Cadeiras, das organizações de bailes, passeatas, e, acima de tudo, leal e firme posicionamento diante da revolução. Aí que saudade do Titico (o Seu Roque do nosso tempo), que punha ordem na casa, verdadeiro xerife do CALQ. Era o local de encontro diário e, mesmo dos fins de semana, pois muitas repúblicas e pensões ficavam na cidade. A Viúva da Colina, apenas quatro quadras. A Casa do Estudante, praticamente começa a ser habitada em 1963 com os primeiros moradores, egressos de republicas e pensões.

Ai que saudade da minha republica Viúva da Colina, local de aprendizado de que o tecido social é cerzido de linhas e fios de convivência, conveniência, convergência, conivência e coexistência pacífica (sobre isto já escrevi no livro Republica: Escola da Vida, no “De volta à Rua Moraes Barros, 447”). Os laços são infindáveis. O tal do “network” republicano permanece e meus velhos companheiros vivos estão por ai e nós sabemos onde nós estamos. É difícil encontrá-los pessoalmente (parte já aposentada e avós, como eu), sessentões e uns anos, mas acima de tudo esalqueanos amigos e “amigo é coisa para se guardar do lado direito do coração”. Fui padrinho de casamento de três deles e padrinho de batismo de filho de um quarto, que foi padrinho de meu casamento, representando a republica. Tudo em família. Admirava ver meus companheiros de republica montando guarda, verdadeiros enfermeiros, quando um caia de febre ou ficava doente. Observação: Viúva da Colina, pois Piracicaba era conhecida como “Noiva da Colina”.

E “onde estão meus velhos companheiros...foram tantos janeiros”. Que saudade do Lampião Vital e do Sarobinha Dirceu, velhos companheiros de republica e que já partiram deste mundo, bem como cerca de duas dezenas de colegas da saudosa F-66, a melhor depois da melhor turma da ESALQ, que em respeito ao Roberto Rodrigues (Fifi), nosso Ministro da Agricultura, diz ser a F-65.

Finalmente, que saudades da ESALQ dos anos 60. Escola “risonha e franca”. Que saudade da amizade provinciana e leal entre colegas e professores que nos recebiam em suas casas, tempo de formação dos verdadeiros “filhos DE Luiz de Queiroz”. Nesta oportunidade, aberta pelo Arado, veiculo histórico de comunicação de nosso CALQ, só resta agradecer à minha Escola, pelo que me ofereceu em minha vida e pelos ensinamentos que norteiam meus passos profissionais até hoje. Receba meu eterno agradecimento, reconhecimento e veneração.

Vou em frente, pois “o tempo não para! Só a saudade é que faz as coisas pararem no tempo...”(Mário Quintana). E aí, ai que saudades de minha mocidade nos anos 60 na velha e querida escola.

Vavá (Evaristo M. Neves)

 

Obs. Escrito para o jornal “O Arado” do CALQ, maio 2007, por solicitação do Conselho Editorial do Jornal.

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