Blog Esalqueanos
Por que não me Ufano do Agronegócio Brasileiro (Aza-Brank)
30/06/2015 - Por gustavo togeiro de alckminAtenção: Os textos e artigos reproduzidos nesta seção são de responsabilidade dos autores. O conteúdo publicado não reflete, necessariamente, a opinião da ADEALQ.

Nem tudo
que reluz é ouro.
Ainda que
os resultados do crescimento do PIB agrícola sejam expressivos frente à uma economia
em franca decadência, nos cabe um exercício de reflexão que vai além do ufanismo
baseado em análises do passado recente.
O livro de
Nassim Taleb intitulado "Black Swan", apresenta uma anedota sobre a análise de
peso-vivo de um peru destinado ao dia de ação de graças: do nascimento ao
momento de abate, o animal apresenta ganho de peso contínuo e crescente. No
entanto, imprevisível aos olhos do analista daquela série histórica, em uma
fração de segundo, alguns dias antes do dia da ação-de-graças, o peso-vivo -
por motivos óbvios - se torna zero.
Há uma
forma tupiniquim de abate: embriagar a ave com uma bela dose de cachaça antes
do golpe derradeiro. Morre o pobre bicho embriagado, grugrulejando alegremente,
sem pensar que o seu destino pode ser igual à dos demais animais da fazenda (em
nosso caso, a indústria e o comércio) e nem que o dia de amanhã será bem
diferente de tudo que ele conheceu até agora.
Somos o
peru. A cachaça é o ufanismo. A morte casi-certa virá, no entanto, da nossa
própria incapacidade e não das mãos de terceiros.
Para que
todos entendam: o Brasil é um fazendão. O problema é que do outro lado do
Atlântico em 30 ou 40 anos (quiçá menos) haverá outro fazendão: a África.
A lógica é
simples e pode ser exemplificada com um caso já em curso:
A Holanda produz
e é detentora de material genético para produção de flores e, ao mesmo tempo,
possui um sistema de leilão de vendas na cidade de Aalsmeer da onde distribuem
para todo o mundo - possuem o começo e o final da cadeia. O Quênia produz. A
primeira pergunta é: quem você acha que ganha dinheiro nessa história?
A segunda pergunta é: qual modelo de negócio
queremos seguir? Ainda, temos algum plano de negócios para o agronegócio no
horizonte de 10 à 20 anos?
Como o
Quênia, o Brasil produz. Cabe perguntar: na mão de quem está a venda de inputs
(químicos, sementes e fertilizantes)? Na mão de quem estão as tradings? Aonde
estão as grandes empresas brasileiras de maquinário agrícola?
Recebemos a
conta pelo desmatamento de florestas tropicais; o contrassenso nessa história é
que quem nos julga, lucra conosco.
Fazem bem o
seu papel; nós fazemos mal.
Sem vitimização:
a culpa é nossa. Somos um país míope aonde se governa com vistas à próxima eleição.
Muito se discute para não se resolver nada.
Em terras tupiniquins há a luta contra as commodities em um lado e, do outro, a veneração à motosserra do outro. Somam-se ainda empecilhos já bem conhecidos por todos do setor do agronegócio.
"The long run is here is time to get sober"Ficam as perguntas para reflexão:
- · Em um país cada vez mais urbano, em 30 anos, quem irá trabalhar a terra?
- · Como estarão os projetos de produção de commodities na África financiado pelo chineses?
- · Como podemos atrair pessoas do meio urbano para o rural?
- · Qual o destino das cabeças pensantes das ciências agrárias?
- · Como se atrai bons estudantes de mestrado - os nossos futuros cientistas - com um bolsa de R$1.500,00?
- · Qual o destino dos egressos dos cursos de ciências agrárias - eles realmente trabalham naquilo em que foram formados?
- · O formato do curso de ciências agrárias responde as necessidades atuais do Mercado?
- · Aonde estão e qual a qualidade dos cursos técnicos nesta área?
- · Aonde estão os programas de formação de jovens agricultores?
- · Na bancada ruralista, quem realmente entende alguma coisa de ciências agrárias?
- · Por que a P&D em ciências agrárias fica à cargo de empresas públicas (e.g. Embrapa)? Qual é o custo/benefício destas?
- · Quem pode acessar ao Pronaf? Porque não estimular os egressos dos cursos de ciências agrárias à se instalar em zonas rurais?
- · Porque se desmata em fronteiras agrícolas mesmo havendo grandes extensões de terra no Sul e Sudeste ocupados com pastagens de baixíssimos índices zootécnicos?
- · Em quais elos da cadeia ficam as maiores fatias de lucro?
- · O código florestal garante a conservação de recursos naturais?
- · E se acabarem as fontes de fertilizantes?
- · E se o clima mudar?
- · E a agricultura urbana?
A lista é longa... Aproveitando os dizeres de
um outro livro e série televisiva famosa: "O inverno está chegando". Vale a
pena refletir um pouco sobre os nossos movimentos no jogo de tronos do agronegócio
mundial. Afinal, nem somos reis e já corremos o risco de sermos destronados.
O longo-prazo está aqui e é hora de ficarmos sóbrios.
Gustavo
Togeiro de Alckmin (Aza Brank - F10) Eng. Agrônomo e ex morador da Republica Mocó-K