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Politica (Pinduca F68)

14/11/2015 - Por marcio joão scaléa
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Era o ano de 1966, auge da revolução, véspera do AI-5, movimento estudantil a todo vapor. Assembléia no Centro Acadêmico, decisão de greve imediata e passeata de protesto para daí alguns dias, a mobilização parecia geral.

 

Grande verdade, a mobilização parecia geral, mas não era. Decretada a greve, palavras de ordem e convocações para comissões e grupos de trabalho, no dia seguinte cedinho.

 

Manhã seguinte, decepção. Dos mil alunos da graduação de Agronomia, mais uns duzentos da pós graduação, mais umas centenas da Economia Doméstica  e centenas de professores, não se conseguia reunir 50 gatos pingados para formar 5 comissões que passariam o período de greve discutindo assuntos como Reforma Universitária, Reforma Política, Reforma Agrária. A maior parte viajava para casa, outros iam pescar, muitos simplesmente dormiam e boa parte caia na gandaia : churrasco, cachaça e Ripolandia. Talvez seja por isso que os mesmos assuntos continuem, quarenta anos depois, a ser o objeto de discussões, seja no Congresso, seja nas mesas de bar, onde os políticos e os teóricos criam os programas e as teorias que irão salvar o Brasil.

 

Mas a passeata ia sair, com ou sem repressão. Hora marcada, começavam a chegar à Catedral os primeiros "revolucionários", que viam, apreensivos, os policiais começando a fazer o cerco à igreja. Na frente os cavalarianos, vindos de Campinas, atrás a infantaria. Discussões apressadas entre os líderes, concluiu-se que o grande problema seriam os policiais a cavalo, e decidiu-se : alguém sairia da Catedral, com dinheiro, para comprar rolhas e bolinhas de gude, receita infalível pra cavalo não parar em pé. Rápida avaliação, o Universitário foi o escolhido :

 

- Pinduca, toma aqui um dinheiro, sai de fininho e busca nas lojas da Rua Governador o que tiver de rolha e bolinha de gude.

 

E lá foi o idiota, todo compenetrado, sentindo-se um James Bond. Conseguiu a muito custo um meio saco de rolhas e umas 200 bolinhas, limpando o estoque dos armarinhos próximos, dispondo-se em seguida a voltar, doce ilusão, para junto dos demais revolucionários, dentro da Catedral.

 

Cerco fechado, ordens de comando, o Universitário percebeu que algo muito mais pesado do que a retórica das assembléias ia começar a funcionar : os cassetetes da Força Pública, de mais de metro de altura. Aí se deu conta de sua ingenuidade, parado na porta da galeria, com meio saco de rolhas que não dava para esconder, tentava disfarçar, quando foi salvo pelos gritos de "abaixo a ditadura" que inundavam a praça.

 

O Bispo havia negociado com o Comandante do cerco que a passeata sairia, desde que censurados os cartazes e faixas de protesto, saída honrosa para ambas as partes, evitando uma violência que não faria bem a ninguém.

 

Encerrou-se aí a carreira política e revolucionária do Universitário.

Marcio Joao Scaléa (Pinduca F68) é Engenheiro Agrônomo ex morador da Republica Mosteiro

 

 

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