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Pesquisa, Desenvolvimento e Controle Público (Froxo; F90)
26/07/2018 - Por goran kuhar jezovsekAtenção: Os textos e artigos reproduzidos nesta seção são de responsabilidade dos autores. O conteúdo publicado não reflete, necessariamente, a opinião da ADEALQ.
PESQUISA, DESENVOLVIMENTO E CONTROLE
PÚBLICO
Quando um
produtor rural compra um saco de sementes certificadas, com a expectativa em
vários casos de produzir mais de 250 sacos de milho ou 100 sacos de soja por
hectare, está consciente que mais do que um volume de grãos selecionados, está
comprando um pacote tecnológico para aumentar sua produção e sua produtividade.
Naquela embalagem estão reunidos normalmente, um cultivar superior,
desenvolvido especialmente para sua região (e época de plantio), que carrega
dentro de si uma ou mais tecnologias para o auxílio no controle de pragas ou
plantas invasoras, tratadas com produtos químicos que ajudam a proteger este
investimento durante a sua armazenagem e nos estágios iniciais do
desenvolvimento das plantas no campo.
Sempre que
recebe a visita de um representante comercial das diferentes empresas que
disputam sua preferência como provedor de insumos, lendo artigos em revistas ou
na internet, ou ainda em eventos do setor com palestras técnicas, absorve a
informação de cada um desses fatores consome anos de pesquisa e milhões em
investimentos, seja por entidades públicas ou privadas, mas raramente sabe do
papel que diferentes agentes governamentais têm para que ele possa desfrutar
dos avanços tecnológicos que ele decide adotar.
Deixando de lado
os requerimentos operacionais para pesquisa e desenvolvimento de novas
tecnologias transgênicas ou agroquímicos e para a produção de sementes
certificadas, cada pacote tecnológico passa pelos seguintes ritos antes de
poder chegar a uma propriedade rural:
Cultivares: para poder ser produzida e comercializada no Brasil, uma cultivar
deve ser registrada no Registro Nacional de Cultivares (RNC) no Ministério da
Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA). Para tanto, cada novo material deve
passar por testes de Valor de Cultivo e Uso (VCU), onde é comparado em uma
série de fatores, com materiais já comercializados. Estes testes devem ser
realizados nas regiões onde os materiais serão recomendados para uso, em duas
safras, em locais previamente comunicados ao Ministério. O processo de registro
em si leva alguns poucos meses.
Em paralelo,
especialmente para espécies alógamas, pode-se também requerer a proteção da
cultivar, que garante ao seu obtentor (pessoa ou empresa que desenvolveu o
material) os direitos de propriedade intelectual sobre esta. Este processo
também está sob responsabilidade do MAPA e o requerente tem de apresentar dados
que identifiquem a cultivar, obtidos em ensaios de DHE, que demonstram que a
cultivar é distinta, homogênea e estável. Estes dados podem ser gerados fora do
Brasil. A proteção não é requisito necessário para a comercialização do
material, mas só pode ser pedida no máximo após um ano depois da primeira
venda.
Tecnologias
transgênicas: a avaliação da segurança para a saúde
e o meio ambiente do uso de uma tecnologia obtida por técnicas de engenharia
genética, também conhecidas como transgênicas, está sob responsabilidade da
Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) do Ministério da Ciência,
Tecnologia, Inovação e Comunicação. Esta Comissão é formada por representantes
de diferentes órgãos do governo e especialistas do meio acadêmico, que não têm
dedicação exclusiva a ela. Cada nova tecnologia deve ser avaliada segundo os
parâmetros determinados pela CTNBio, assim como a combinação de diferentes
tecnologias (por exemplo uma ou mais resistência a pragas e uma ou mais
tolerância a herbicidas), também deve ter uma avaliação e aprovação específica,
mesmo que as tecnologias individuais já estejam aprovadas. O prazo para essas
avaliações fica entre dois a três anos em média.
Agroquímicos: o registro de defensivos agrícolas (também conhecidos como
agrotóxicos ou pesticidas) fica a cargo do MAPA, mas o processo tem a
participação da ANVISA e do IBAMA nas avaliações dos riscos para a saúde e para
o meio ambiente, respectivamente. Além disso, vários estados brasileiros exigem
o cadastro do produto para que ele possa ser comercializado nos seus
territórios. No caso de novas moléculas, o processo de registro pode levar de 6
a 9 anos da sua solicitação até a sua concessão.
Um grande número
de profissionais, somando os pesquisadores responsáveis pela geração dos dados
necessários aos diferentes registros, os especialistas que montam os processos
e os técnicos que fazem as avaliações dessas informações, está envolvido nos
processos que permitem a adoção dos novos pacotes tecnológicos pelos produtores
brasileiros, tornando irresponsáveis os discursos alarmistas contra seu uso no
país.
Infelizmente a
demora dos processos burocráticos que garantem a qualidade e a segurança dos
insumos oferecidos, sem entrar no mérito das causas desta, gera alguns
problemas graves, como o comércio ilegal de produtos, seja por contrabando ou
falsificação, que devem ser repudiados pelo setor e combatidos pelas
autoridades competentes.
Que o sistema
burocrático possa evoluir na mesma velocidade que a inovação tecnológica, e que
não seja uma barreira para a entrada de novos atores na agricultura brasileira.
Goran Kuhar Jezovsek (Froxo; F90) é Eng.Agrônomo, especialista em assuntos regulatórios do agronegócio e ex-morador da República Jacarepaguá.