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Liberdade, liberdade, abre as asas sobre nós! (Pãtanero F10)

14/01/2017 - Por tiago alves corrêa carvalho da silva
Atenção: Os textos e artigos reproduzidos nesta seção são de responsabilidade dos autores. O conteúdo publicado não reflete, necessariamente, a opinião da ADEALQ.

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Recentemente o tema do samba-enredo da Imperatriz Leopoldinense para o carnaval 2017 levantou grande discussão no meio agrícola (1,2). O tema principal na letra do samba (3) é o enaltecimento dos indígenas do Xingu como guardiões da floresta, os quais vivem em total harmonia neste meio. Harmonia esta que foi quebrada com a chegada do caraíba (homem branco) que trouxe a cobiça e a destruição de matas e rios. O samba termina com o refrão:

 

Salve o verde do xingu… a esperança

A semente do amanhã… herança

O clamor da natureza

A nossa voz vai ecoar… preservar!”

 

A mensagem é clara. O Brasil pré-descobrimento era o paraíso na terra (“o paraíso fez aqui o seu lugar”) e seus primeiros habitantes, puras almas celestiais, as únicas capacitadas a preservar este paraíso. Dentre as alas apresentadas pela escola para este samba estão: ”Fazendeiros e seus agrotóxicos”, “doenças e pragas”  e “olhos da cobiça”.

 

Tendo em vista as inúmeras manifestações de repúdio e criticas realizadas por instituições ligadas ao agro, o carnavalesco da escola concedeu uma entrevista (4) defendendo o enredo e alegando que a critica é pontual aos que desrespeitam a floresta e que em nenhum momento a intenção era agredir o agronegócio como um todo. Também afirmou que o tema principal do enredo é a exaltação aos povos indígenas, sua luta pela sobrevivência e sua floresta.

 

A única conclusão que se tira é que se intenção não era de criticar o agronegócio, o enredo e as alegorias foram muito mal elaboradas. Seria difícil acreditar em tamanha falta de sensibilidade advinda de um setor onde a comunicação de ideias é pivô central do oficio. De maneira completamente contraditória a declaração dada pelo carnavalesco, a escola divulgou orgulhosamente em sua pagina oficial no facebook (5) um artigo em que o Prof. de literatura da UFMT celebra a atitude de colocar o “agronegócio na mira” durante o enredo de 2017. Em suas palavras o agronegócio.. “além de não produzir postos de trabalhos na proporção da quantidade de terras que ocupa, está sempre atolado em pesados agrotóxicos, comprovadamente, provocadores de adoecimentos de populações e de mortes de rios, incluindo o comprometimento de lençóis freáticos.” Demonstrando desde já a vocação da Imperatriz Leopoldinense em se utilizar de mentiras para sua promoção e desmentindo a narrativa apresentada pelo carnavalesco durante a já referida entrevista.

 

Mas porque essa crítica incomodou tanto os produtores e instituições ligadas ao setor? Afinal, em anos anteriores o agronegócio já foi usado como tema de samba enredo de maneira positiva. Nada mais democrático que aceitar as criticas, certo? Na minha opinião as respostas para essas questões se dão pelos seguintes fatores:

 

1 – Os profissionais envolvidos com a produção agrícola estão cansados de serem acusados indiscriminadamente por crimes que não cometeram. Acredito que este seja o ponto central de indignação. Desmatamento ilegal, racismo, trabalho escravo, poluição e genocídio indígena são apenas alguns dos crimes que são todos os dias expostos na mídia como sendo consequências diretas do agronegócio. A resposta a essas falsas acusações já foram discutidos em diversas oportunidades no âmbito da importância econômica, social e ambiental (6, 7, 8) e não vamos focar neste debate. Porém afirma-se também que o agro é o causador do “genocídio indígena” (9). O uso da palavra genocídio aterroriza qualquer cidadão comum que conhece a violência que se espalha pelo pais. Seriam os indígenas vitimas mais frequentes de assassinatos que os brasileiros não índios? Vamos aos números. Em 2015 foram registrados 59.627 mil homicídios no Brasil (10) sendo 137 destes contra indígenas (11). Considerando a população brasileira não-índia de 203.570.1561 (12) e a indígena de 880.4932 habitantes (13) chega-se aos valores de 15.6 e 29.2 assassinatos para cada 100 mil habitantes para índios e não-índios, respectivamente. Ou seja, mata-se quase duas vezes mais não-índios do que índios no Brasil. Além disso, a secretaria  de Estado de Justiça e Segurança Pública do Mato Grosso do Sul afirma que, no período entre 2006 e 2013, 92% dos homicídios contra indígenas no estado tiveram outros indígenas como autores (14). Os números não parecem contar a mesma história que os carnavalescos e os professores de literatura martelam a torto e a direito nas cabeças dos cidadãos médios. Mas alguém poderia também argumentar que os produtores rurais estariam invadindo áreas indígenas e expulsando esses da suas reservas. Seriam essas alegações verdadeiras? Segundo o mesmo relatório anteriormente citado desenvolvido pelo CIMI (11), em MS no ano de 2015 houveram 2 casos de invasões possessórias contra terras indígenas, todas essas invasões com o objetivo de exploração de madeira ilegalmente. Também em todos esses casos, a madeira foi comercializada pelos próprios guardiões da floresta (11, 15). Segundo as reportagens ambos os casos foram solucionados e os criminosos autuados (muito provavelmente somente os não-indígenas). Aproximadamente no mesmo período de um ano entre agosto de 2015 (16) e setembro de 2016 (17), 34 propriedades rurais, todas compradas legalmente e tituladas pelo Estado brasileiro, foram invadidas por indígenas nesse mesmo estado. O numero total de propriedades invadidas hoje chega a 122 sendo que algumas dessas invasões ocorreram a mais de uma década. Nenhuma resolução por parte do governo, condenações ou qualquer forma de resolução do problema foi apresentado durante a ultima década. Todas essas propriedades tiveram as famílias dos proprietários e funcionários expulsas, muitas tiveram seus pertencem destruídos, roubados e sofreram agressões físicas. Falo isso por experiência própria. O Brasil realmente precisa ser estudado. Nós provavelmente somos o único lugar no mundo em que um grupo acusado de praticar genocídio, morre e sofre mais violência advinda do grupo que supostamente esta sendo perseguido. Ou melhor, provavelmente somos o único lugar do mundo em que esse tipo de acusação é amplamente aceita sem que ninguém exija dados empíricos que sustentem essa linha argumentativa.   

 

2 – Muito além do que uma exaltação da cultura dos povos indígenas, a pauta representa um posicionamento político claro e contrário ao modelo atual do agronegócio como um todo. Afinal a cobiça trazida pelo homem branco, na ideia desses sambistas, obviamente só existe em sistemas de explorações agrícolas que visem o lucro. Além disso, reforça a falsa narrativa de que ser a favor do agronegócio é ser contra o desenvolvimento dos povos indígenas e consequentemente da conservação ambiental. Nada mais falso e preconceituoso. Graças as tecnologias geradas através do estimulo do lucro nossos níveis de produtividade e produção crescem a cada ano sem a necessidade de abertura de novas áreas de floresta. Caso estivéssemos utilizando as mesmas técnicas produtivas dos guardiões da floresta para manter a produção atual, não restaria um metro quadrado de solo para se fazer conservação ambiental.

 

 

3 – Os verdadeiros culpados nunca são nomeados. Se o agronegócio não tem relação com a situação atual dos indígenas brasileiros. Então o que explicaria as desigualdades existentes entre essas populações e o resto do Brasil? A resposta para esta pergunta não é simples nem direta, mas podemos tomar como exemplos outros grupos étnicos ao redor do mundo para elaborar um raciocínio. Uma das características que define um povo é de possuir uma determinada cultura. Uma cultura, como aponta Thomas Sowell (18), não consiste apenas em costumes, valores e atitudes mas também habilidades, talento e um modo especifico de vida que diretamente afetam os desempenhos econômicos, o que é chamado de capital humano pelos economistas. Os germânicos por exemplo carregaram e mantiveram sua cultura em todos países que emigraram desde Austrália, Brasil, Rússia ou Estados Unidos. Dentre as habilidades trazidas por esses imigrantes estava a de produzir pianos, o que os levou a serem os primeiros produtores de piano na América além da Austrália, França, Rússia e Inglaterra. Ou seja padrões de comportamentos repetidos ao longo do tempo em diferentes cenários geográficos e políticos gerando consequências semelhantes. Além dos alemães diversos outros grupos étnicos apresentam comportamento semelhante. Como os Chineses em vários países do Sudeste Asiático e no ocidente; os libaneses no Oeste da África, Austrália e Américas; os judeus na Europa, Oriente Médio e Austrália e Indianos em todos os continentes habitados do globo. Muitos desses chegando ao pais de destino em condição de pobreza extrema, sem habilidade de se comunicar utilizando a língua local e nenhum conhecimento da região. Nos Estados Unidos no começo do século dezenove a maioria dos imigrantes libaneses começaram a vida como vendedores ambulantes. Após alcançado algum avanço econômico, muitos abriram suas próprias lojas. Essas se constituíam em empreendimentos que demandavam o trabalho da família toda e ficam abertas de 16 a 18 hrs por dia. As casas geralmente se localizavam ao lado da loja ou no andar superior. Grandes marcas hoje mundialmente conhecidas como Levi Strauss, Macy’s e Bloomingdale’s criada por imigrantes Judeus e Haggar e Farah por libaneses, tiveram seu inicio como vendedores ambulantes no nível mais baixo da escada econômica. E em todos esses exemplos esses grupos apresentaram significativos avanços sociais e econômicos, muitas vezes superiores aos da população residente, em poucas gerações. Dada as diferenças culturais levadas e mantidas por esses grupos para cada local que estes emigraram, não existe razões para esperar desempenhos econômicos semelhantes entre eles muito menos com as populações existentes nos país de destino destas ondas migratórias. Na ESALQ-USP, eu estimaria com segurança que todos os anos pelo menos dois alunos naturais de Holambra são admitidos para o curso de Eng. Agronômica. Um desempenho impressionante para uma cidade com uma população tão modesta (13.375 hab). A conclusão que se tira desses fatos é clara, mas impossível de ser engolida pelos defensores do multiculturalismo. Resulta que, ao aceitar que o modo de vida e os costumes de um povo resultem em impactos na capacidade de produção de riqueza, leva invariavelmente a conclusão que existam culturas que favoreçam mais a ascensão social do que outras. No caso dos indígenas, seria um sacrilégio para os intelectuais defensores do multiculturalismo afirmar que o modo de vida e seus hábitos afeta o seu desempenho econômico e que partes do seu comportamento precisariam mudar para que ocorressem avanços sociais. Ou seja as causas do problema continuam mas o resultado tem que ser diferente. E se o resultado não é diferente a culpa é do resto da sociedade. Nenhum individuo pode ser culpado por ter nascido em uma determinada circunstancia de atraso social ou econômico, mas também nenhuma sociedade deve ser automaticamente assinalada como a causa ou a cura dessas determinadas diferenças (19). Obviamente crimes absurdos cometidos no passado ocorreram e não devem ser esquecidos. Porém, condenar um cidadão ou grupo a pagar uma “divida histórica” com a qual estes não tem nenhum tipo de ligação é cometer outro crime para tentar redimir o passado. No Brasil intelectuais, indigenistas, ONGs, FUNAI, militantes do PSOL, sambistas e professores de literatura acreditam que o único fator limitante para o pleno desenvolvimento das comunidades indígenas é a terra e que mantê-los enjaulados em zoológicos humanos conhecidos como reservas é o melhor para que esses não sofram contaminação de nossa degenerada cultura ocidental. Além disso, uma completa rede de assistencialismo é naturalmente necessária para tentar remediar os erros do passado. Não podemos também nos esquecer da imputabilidade penal que obviamente é necessária para que não cometamos ainda mais injustiça. Pronto! Agora sim temos a receita completa do fracasso: isolamento + dinheiro sem trabalho + diminuição das responsabilidades jurídicas. A cereja do bolo vem para garantir o desastre: um bode expiatório para a causa dos seus problemas! A cereja obviamente fornecida por estes mesmos intelectuais iluminados que naturalmente sabem mais que os próprios indígenas o que é melhor para o futuro deles. Difícil imaginar qual sociedade não entraria em colapso diante da mesma situação. Theodore Dalrymple (20) descreve com propriedade como a propagação do estado de bem estar social, o relativismo cultural e a eliminação do conceito de responsabilidade por seus atos vem afetando a vida dos menos privilegiados na Grã-Bretanha. Paradoxalmente, os maiores prejudicados são os mesmos indivíduos que os criadores destas ideias dizem ou pretendem defender. Mas obviamente, assim como no Brasil, para estes intelectuais é muito mais importante o falso preenchimento do seu ego do que a real analise da consequência de suas ideias.

 

4 – Quem cala consente. Diante de toda argumentação levantada, evidencia-se a necessidade do repúdio a atitude da Escola de samba Imperatriz Leopoldinense. Nós, integrantes do agronegócio brasileiro nos sentimos orgulhosos do nosso papel no desenvolvimento econômico e social do nosso pais. Mas também sabemos que nada é perfeito, e que existem criminosos em todos setores, inclusive entre os indígenas e produtores rurais. Porém é necessário ressaltar o efeito que a grande maioria exerce é muito mais relevante que as exceções. E por isso condenamos falsas generalizações como esta. Temos a total convicção que estamos no caminho certo e somos reconhecidos ao redor do mundo por nosso trabalho. Não nos calaremos diante de calunias e difamações e estaremos sempre abertos ao debate honesto de ideias.

 

Referencias

 

1)http://www.noticiasagricolas.com.br/noticias/agronegocio/185126-carnavalesco-da-imperatriz-leopoldinense-diz-que-nao-queria-ofender-o-agronegocio.html#.WHiGRKOr3-Y

2)http://www.beefpoint.com.br/cadeia-produtiva/giro-do-boi/escola-de-samba-imperatriz-leopoldinense-criticara-o-agronegocio-no-carnaval-2017/

3)http://www.carnavalesco.com.br/noticia/imperatriz-2017-samba-da-parceria-de-moises-santiago/18043

4)http://blogs.canalrural.com.br/kellensevero/2017/01/06/contra-o-agro-ou-nao-carnavalesco-da-imperatriz-leopoldinense-explica-o-enredo-da-escola/

5)http://www.folhamax.com.br/opiniao/tempestade-no-carnaval/110970

6)http://www.beefpoint.com.br/cadeia-produtiva/giro-do-boi/agronegocio-sustenta-maior-superavit-da-historia-da-balanca-comercial-brasileira/

7)http://markestrat.org/agribusiness/wp-content/uploads/2016/12/vai-agronegocio-marcos-fava-neves.pdf

8)http://opiniao.estadao.com.br/noticias/geral,agrotoxicos-sao-necessarios-ou-nao,10000063690

9)http://oglobo.globo.com/opiniao/o-ideologo-do-agronegocio-o-genocidio-18241203

10)http://oglobo.globo.com/brasil/mapa-da-violencia-2016-mostra-recorde-de-homicidios-no-brasil-18931627

11)http://www.cimi.org.br/pub/relatorio2015/relatoriodados2015.pdf

12)http://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?jornal=1&pagina=98&data=28/08/2015

13)http://www.brasil.gov.br/governo/2015/04/populacao-indigena-no-brasil-e-de-896-9-mil

14)http://www.agrolink.com.br/fertilizantes/artigo/indigenas-sao-autores-da-maioria-dos-homicidios-nas-aldeias--diz-sejusp-ms_174494.html

15)http://www.campograndenews.com.br/cidades/ibama-descobre-esquema-de-venda-ilegal-de-madeira-na-reserva-indigena-kadiweu

16)http://g1.globo.com/mato-grosso-do-sul/noticia/2015/08/cerca-de-80-indios-ocupam-cinco-fazendas-em-antonio-joao-ms.html

17) http://famasul.com.br/assessoria_interna/famasul-recebe-governo-federal-para-tratar-sobre-conflitos-fundiarios-de-ms/44686/

18) Thomas Sowell – Wealth, Poverty and Politics: An international perspective.

19) Thomas Sowell – Intellectuals and Race.

20) Theodore Dalrymple – Life at the bottom

 

Notas:

Calculo baseado da estimativa de população brasileira em 2015 disponível em (12) menos a estimativa da população indígena para o mesmo ano.

2  População indígena para o ano de 2015 foi estimada baseada levando-se em conta a população contabilizada pelo IBGE em 2010 e utilizando a mesma taxa de crescimento que população brasileira durante o período. 


Tiago Alves Corrêa Carvalho da Silva (Pãtanero F10) Ex Morador da República Zona Rural é aluno de Doutorado da School of Agriculture and Food Science, University of Queensland

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