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Carta Conjuntura - Os navios boiadeiros, os valores agregados e os ativistas radicais

20/02/2018 - Por alcides de moura torres junior
Atenção: Os textos e artigos reproduzidos nesta seção são de responsabilidade dos autores. O conteúdo publicado não reflete, necessariamente, a opinião da ADEALQ.

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Que o Brasil é um dos maiores produtores mundiais de carne bovina ninguém tem dúvidas, contudo um segmento ainda pouco conhecido é a exportação de gado bovino em pé. 


Nosso país é um dos maiores exportadores de bovinos vivos do mundo. 


De acordo com o MDIC (Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços), em 2017 foram exportadas mais de 400 mil cabeças, aumento de 42% em relação à 2016. Essas cabeças embarcadas resultaram em faturamento de 269,5 milhões de dólares. 


Em média, os bovinos vendidos pesam 320 kg. Existem restrições quanto ao tamanho dos animais em alguns países. Para a Turquia, por exemplo, como há limite de peso, o peso médio foi de 272kg. Para o Líbano, o peso médio foi de 494kg.


Cada país determina exigências e requisitos sanitários, e a legislação brasileira estabelece normas para exportação¹, por exemplo:


- Os animais devem ser reunidos e isolados, antes do embarque definitivo, no Estabelecimento Pré-embarque (EPE) previamente aprovado pelo Departamento de Saúde animal;


- Os animais somente poderão ser exportados acompanhados de Certificado Zoosanitário Internacional (CZI) aprovado pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA)


- Os animais selecionados devem ser devidamente identificados individualmente; 


- Os animais não devem apresentar qualquer condição que possa comprometer a sua saúde e bem-estar. 


Mesmo com rigorosa legislação interna, com as demandas específicas de cada país, com as interferências de fatores econômicos e políticos, e o câmbio, o Brasil pode atender esse mercado e devemos aproveitar essa oportunidade. 


Mercado 


No Pará, por exemplo, o potencial produtivo aliado à localização geográfica privilegiada faz com que este estado tenha importante participação na exportação de bovinos vivos. 


Em 2017 exportou 259,9 mil cabeças. Maior quantidade desde 2013. (Figura 1)



Os destinos em 2017 foram: Turquia, Egito e Iraque, nesta ordem de importância. 


O Rio Grande do Sul também se beneficia desse nicho de mercado e agrega valor aos animais exportados. Segundo pesquisa da Scot Consultoria, é pago de R$1,00 a R$1,50 a mais por quilo para animais destinados à exportação. 


Há quem diga que o movimento é inverso, que esse tipo de negócio prejudica a cadeia, pois o produto vivo deixa de agregar valor e empregos, e que reduz a oferta local, encarecendo o produto interno. 


Primeiro ponto: fundamentos de mercado são fundamentos de mercado. 


Da mesma maneira que excesso de oferta pressiona negativamente preços, a falta dela em decorrência da concorrência, também influencia as cotações. Competição de mercado é assim. (mencionaremos a seguir a participação das exportações frente ao rebanho nacional).


Segundo ponto: o valor agregado na venda de bois vivos vai para o bolso do produtor. É geração de renda. A venda de carne, vai para o frigorífico. 


Esse produtor, melhor remunerado, fará investimentos que movimentarão o mercado regional. Compra de insumos, produtos veterinários, adubos, maquinários... Todos ganham, se o produtor vai bem o resto da cadeia vai bem também.


Além disso, a exportação de gado em pé beneficia não somente o setor pecuário como também o setor portuário e rodoviário através de investimentos para melhorias em infraestrutura e contratação de mão-de-obra, prestadores de serviço e técnicos especializados. 


Ainda vale ressaltar que o volume de bovinos exportados é irrisório frente ao rebanho nacional total (menos de 0,2%). Ou seja, os impactos da exportação de bovinos no mercado interno são pequenos.


Vale lembrar que o mercado de gado vivo não concorre com o mercado de carnes, isso porque os países que importam gado em pé não demandavam e não demandam nossa carne bovina. 


Os principais compradores de carne bovina brasileira são Hong Kong e Rússia. 


E um dos grandes compradores de gado vivo do Brasil é a Turquia (Figura 2). Em 2017 o país importou 221 mil animais, ou seja, mais de metade da exportação brasileira. 



A exportação de gado em pé é um nicho de mercado que contribui com o escoamento da produção, e que atende à critérios de qualidade específicos.


Por atender a esses critérios específicos a cotação do gado exportado é até 25% maior, fazendo da exportação uma atividade atrativa que dá alternativa para o produtor e ajuda a drenar o mercado interno. 


Protetores de animais que não protegem


O juiz federal Djalma Moreira Gomes suspendeu liminarmente a exportação de gado vivo pelo Brasil em 2 de fevereiro. 


Durante os tramites jurídicos mais de 25 mil bois comprados pela Turquia estavam confinados em navio atracados no porto de Santos.


Na decisão, Gomes atendeu um pedido de liminar feito pela ONG Fórum Nacional de Proteção Animal e suspendeu os embarques em todo território nacional, "até que o país de destino se comprometa, mediante acordo inter partes, a adotar práticas de abate compatíveis com o preconizado pelo ordenamento jurídico brasileiro".


A ONG alega que o transporte dos animais vivos é feito de forma cruel, causando sofrimentos e traumas por conta de condições climáticas adversas, falta de alimentação ou condições sanitárias.


O juiz determinara o desembarque e retorno à origem, mediante plano a ser estabelecido pelo MAPA (Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento) e operacionalizado pelo exportador, sob fiscalização das autoridades sanitárias, de todos os animais embarcados. 


Vamos por partes.


Primeiro. Contrariando o parecer da prefeitura de Santos, o relatório do SAV (Serviço de Vigilância Agropecuária), que é integrado ao MAPA, indica que os fiscais federais não encontraram qualquer indício de maus tratos durante o embarque e na vistoria realizada a bordo.


Além disso, os fiscais afirmam que todos os bois a bordo estavam saudáveis e sem qualquer machucado, e que os "animais apresentavam expressão de tranquilidade, ausência de dor, ansiedade ou estresse térmico". 


O laudo atestou, ainda, que o ambiente no qual todos os bovinos estavam acondicionados, nos decks do navio, também apresentavam boas condições sanitárias, têm piso adequado e possuem água e alimento em quantidade satisfatória. A embarcação possui, ainda, farmácia veterinária e um médico veterinário responsável pelos bois.


Mediante aos fatos a justiça acolheu pedido da Advocacia Geral da União (AGU) e derrubou a liminar que proibia a exportação de gado vivo em território nacional. 


Na liminar, a desembargadora Diva Malerbi mencionou: "A permanência no navio aguardando os procedimentos de reversão, que sequer encontram-se programados, provocará maior sofrimento e penoso desgaste aos animais do que o prosseguimento da viagem".²


Conclusão


Sendo assim, ficou claro que a demora para o prosseguimento da viagem, problema causado pelas ONGs, foi o maior causador de prejuízos do ponto de vista do bem-estar animal. 


Como diz o ditado popular, "muito ajuda quem não atrapalha." 


A exportação de bovinos vivos é uma atividade regulamentada pelo MAPA através da Instrução Normativa no. 13, de 30 de março de 2010³. Profissionais competentes fazem a vigilância para que a lei seja cumprida, nesse âmbito, a opinião de leigos é um desastre. 


Importante frisar que qualquer tipo de transporte de bovinos deve ser feito em boas condições, seguindo os preceitos para preservar o bem-estar animal. E claro, esses procedimentos são fiscalizados. 


Este tema envolve questões econômicas, políticas, forças do legislativo, do judiciário, além de questões culturais (consumo de carne Halal³).


Entendemos também que discussões engrandecem o debate, mas imposição unilateral de um ponto de vista é autoritarismo genuíno. Afinal é o consumidor que decide o que deseja comprar e não o vendedor. 


No supermercado você pode comprar queijo parmesão em peça ou ralado. Se decidir pelo queijo ralado, pagará mais. Mas nem por isso dever-se obrigar o consumidor a comprar queijo ralado em função do maior valor agregado.


Deixem o mercado decidir. Sem tapetão e sem radicalismo. 


 


¹ Regulamento técnico para exportação de bovinos, búfalos, ovinos e caprinos vivos, destinados ao abate. http://www.agricultura.gov.br/assuntos/sustentabilidade/bem-estar-animal/arquivos/arquivos-legislacao/in-13-2010-exportacao-ruminantes-para-abate.pdf


² Tribunal Regional Federal da 3ª Região - Exportação de animais vivos https://www.poder360.com.br/wp-content/uploads/2018/02/liminar-trf3-gado-turquia-4fev2018.pdf


³ A palavra halal significa "permitido", ou seja, o que se pode fazer, o que se pode consumir, o que se pode ver, o que se pode ler, o que se pode vestir, de acordo com as leis do Alcorão.

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